quarta-feira, 29 de abril de 2009

O olho - KOCHISE

Ainda falaremos muito sobre Kochise, banda anarcopunk francesa ativa desde 1988.

O olho


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(Do LP "Dans le meilleur des mondes...")

As câmeras nos vigiam na rua
dissimuladamente, seguem nossos passos
Vou sem ser detectad@
ou aprisionad@ em sua memória.
A cidade tornou-se
um domínio proibido somente reservado
aos que não nunca andarão
fora dos caminhos batidos.
Perseguid@s pel@s controlador@s
"o seu bilhete de transporte, o seu passaporte!
Siga-nos que vamos verificar
Se você está regularizad@. "

Monitorad@s, policiad@s
câmaras apontadas
sobre os nossos bairros
nós somos filmad@s.
Monitorad@s, policiad@s
em qualquer legalidade,
acusad@s, denunciad@s
Estamos identificad@s.

@ vizinh@, @ transeunte incentivad@s à delação
de qualquer indivíduo suspeit@
Qual o critério para acusá-l@?
Goza de ser policial por um momento?
Sua arma está pronta para atirar
o direito do seu lado el@ não pode duvidar
que el@ pague caro para manter a sua tranquilidade
el@ pode até mesmo matar para manter.
A europa das polícias está se formando
informatizada, um sistema de enquadramento
vigiará seus movimentos.

"Atenção, você está em um bairro protegido
nós te avisamos
que passou desta grade sem autorização
temos o direito de te eliminar"

"Sentiu-se como quem vagueia nas florestas do fundo do mar, perdido num mundo monstruoso onde ele próprio era o monstro. Estava só. O passado morto, o futuro inimaginável. Que certeza haveria de estar ao seu lado uma única criatura humana viva? E de que maneira saber que o domínio do Partido não duraria para sempre? Como resposta, os três lemas da fachada branca do Ministério da Verdade lhe voltaram à mente:
GUERRA É PAZ LIBERDADE É ESCRAVIDÃO
IGNORÂNCIA É FORÇA
Tirou do bolso uma moeda de vinte e cinco centavos. Ali também, em letras minúsculas porém nítidas, liam-se as mesmas frases; do outro lado a cabeça do Grande Irmão. Até do dinheiro aqueles olhos o perseguiam. Moedas, selos, capas de livros, faixas, cartazes, maços de cigarro - em toda parte. Sempre os olhos fitando o indivíduo, a voz a envolvê-lo. Adormecido ou desperto, trabalhando ou comendo, dentro e fora de casa, no banheiro ou na cama - não havia fuga. Nada pertencia ao indivíduo, com exceção de alguns centímetros cúbicos dentro do crânio.
O sol deslocara-se no céu e, na sombra, as miríades de janelas do Ministério da Verdade pareciam as sinistras seteiras de uma fortaleza. O coração de Winston tremeu ante a pirâmide enorme. Era forte demais -não podia ser tomada de assalto. Mil bombas-foguetes não a deitariam por terra.
Tornou a indagar de si próprio: para quem estaria escrevendo o diário? Para o futuro, para o passado - para uma época que talvez fosse imaginária- E diante dele abria-se não a morte, mas o aniquilamento. O diário seria reduzido a cinzas e ele a vapor. Somente a Polícia do Pensamento leria o seu escrito, antes de suprimi-lo e eliminá-lo da lembrança. Como poderia apelar para o futuro sendo impossível a sobrevivência física de um vestígio do indivíduo, e até mesmo de uma palavra anônima rabiscada num pedaço de papel?
A teletela assinalou catorze horas. Precisava sair dali a dez minutos. Tinha de estar de volta ao serviço às catorze e trinta. Curiosamente, o soar das horas pareceu dar-lhe novo ânimo. Ele não passava dum fantasma solitário exprimindo uma verdade que ninguém jamais ouviria. Mas enquanto a exprimisse, a continuidade não seria interrompida. Não é fazendo ouvir a nossa voz mas permanecendo são de mente que preservamos a herança humana. Ele voltou à mesa, molhou a pena e escreveu: Ao futuro ou ao passado, a uma época em que o pensamento seja livre, em que os homens sejam diferentes uns dos outros e que não vivam sós - a uma época em que a verdade existir e o que foi feito não puder ser desfeito:
Cumprimentos da era de uniformidade, da era da solidão, da era do Grande Irmão, da era do duplipensar!
Ele já estava morto, refletiu. Pareceu-lhe que só agora, depois de começar á formular suas idéias, dera o passo decisivo. As conseqüências de cada ato são incluídas no próprio ato. Escreveu:
Crimidéia não acarreta a morte: crimidéia É a morte.
Agora que se reconhecia como defunto, tornava-se importante ficar vivo o mais tempo possível."
George Orwell, 1984.



NÃO À VÍDEO-VIGILÂNC
IA
E À SEGREGAÇÃO SOCIAL

A CIDADE É NOSSA
;
NÃO À POLÍTICA DO GRANDE IRMÃO!
(*)

A vídeo-vigilância parece mesmo estar na moda. Depois de se fazerem presentes em shopping-centers, repartições públicas, bancos e lojas, nas quais adesivos dizem à você para sorrir enquanto as lentes registram todos os seus movimento, as pequenas câmeras agora proporcionam "entretenimento", em programas de TV que vendem a "vida real'. Descartando-se as bobagens televisivas, por certo há quem faça elogios aos olhos de vidro sempre atentos. "É para nossa segurança", dirão uns. Outros jurarão de pés juntos que vídeo-vigilância inibe a criminalidade e, dessa forma, não se importam de ter seus passos cuidadosamente observados.
A vídeo-vigilância, no entanto, não é mais parte unicamente da esfera privada. Nossa cidade, por exemplo, já possui câmeras que funcionam 24 horas por dia em diversos cruzamentos. É só olhar pra cima e ver que elas estão na espreita. As autoridades municipais e a empresa que controla o tráfego afirmam a grande utilidade da vigilância ininterrupta para sanar problemas e garantir o bom fluxo de veículos e, conseqüentemente, para o bom funcionamento das vias públicas. Por trás desses argumentos há uma velha noção repetida para auto-justificar a posição dos burocratas de plantão: "O povo não sabe cuidar de si próprio, portanto, precisa de alguém que o faça..." Esteja claro: essas medidas de vigilância são tomadas, via de regra, sem a consulta ou aprovação dos que supostamente são os maiores interessados, ou seja, a população. Esta, sempre fica sabendo dessas medidas "em seu benefício" através de noticiários de TV ou de notas espremidas nos jornais.
Na verdade a aparição das câmeras não tem relação com o aumento das ocorrências no trânsito nem as diminuiu. A vídeo-vigilância serve, antes, para monitorar qualquer tipo de comportamento "indesejável" que modifique o sentido "normal" da vida na cidade, sendo inclusive ligadas diretamente aos departamentos de polícia. É assim aqui, em outras cidades brasileiras e de outros países. Uma verdadeira política do Grande Irmão, como imaginada por Orwell. Nas ruas, como nos shoppings, as câmeras servem para a segregação social, alertando sobre qualquer conduta indesejável ou suspeita. Para os movimentos sociais elas são especialmente perigosas. Uma manifestação agora conta com a presença da polícia antes mesmo dos manifestantes chegarem. Tudo para manter a ordem, claro... Não seria de impressionar se descobríssemos que a polícia possui arquivos fotográficos de qualquer ato contestatório que tenha ocupado o espaço público; câmeras capazes disso há.
A vídeo-vigilância inculca na população o medo do fantasma da insegurança para dessa forma justificar sua aplicação nas cidades. O que os donos do poder, bem como os aspirantes a esta posição, não discutem é que a "delinqüência", a violência e a insegurança que se sente principalmente nas grandes cidades não podem ser curadas, nem sequer diminuídas, por meio de medidas repressivas e arbitrárias como a vídeo-vigilância dos espaços públicos. Exemplos disso e história está cheia. Medidas repressivas e arbitrárias que são, as câmeras espalhadas por toda a cidade, longe de contribuírem para a solução de qualquer problema social, são uma forma de perpetuá-los, mantendo a população na rédea curta e combatendo qualquer forma de manifestação de inconformismo e insubmissão.


O PANOPTISMO (**)

Eis as medidas que se faziam necessárias, segundo um regulamento do fim do século XVII, quando se declarava a peste numa cidade.(1) Em primeiro lugar, um policiamento espacial estrito: fechamento, claro, da cidade e da "terra", proibição de sair sob pena de morte, fim de todos os animais errantes; divisão da cidade em quarteirões diversos onde se estabelece o poder de um intendente. Cada rua é colocada sob a autoridade de um síndico; ele a vigia; se a deixar, será punido de morte. No dia designado, ordena-se todos que se fechem em suas casas: proibido sair sob pena de morte. O próprio síndico vem fechar, por fora, a porta de cada casa; leva a chave, que entrega ao intendente de quarteirão; este a conserva até o fim da quarentena. Cada família terá feito suas provisões; mas para o vinho e o pão, se terá preparado entre a rua e o interior das casas pequenos canais de madeira, que permitem fazer chegar a cada um sua ração, sem que haja comunicação entre os fornecedores e os habitantes; para a carne, o peixe e as verduras, utilizam-se roldanas e cestas. Se for absolutamente necessário sair das casas, tal se fará por turnos, e evitando-se qualquer encontro. Só circulam os intendentes, os síndicos, os soldados da guarda e também entre as casas infectadas, de um cadáver ao outro, os "corvos", que tanto faz abandonar à morte: é "gente vil, que leva os doentes, enterra os mortos, limpa e faz muitos ofícios vis e abjetos". Espaço recortado, imóvel, fixado. Cada qual se prende a seu lugar. E, caso se mexa, corre perigo de vida, por contágio ou punição. A inspeção funciona constantemente. O olhar está alerta em toda parte: "Um corpo de milícia considerável, comandado por bons oficiais e gente de bem", corpos de guarda nas portas, na prefeitura e em todos os bairros para tornar mais pronta a obediência do povo, e mais absoluta a autoridade dos magistrados, "assim como para vigiar todas as desordens, roubos e pilhagens". Às portas, postos de vigilância; no fim de cada rua, sentinelas. Todos os dias, o intendente visita o quarteirão de que está encarregado, verifica se os síndicos cumprem suas tarefas, se os habitantes têm queixas; eles "fiscalizam seus atos". Todos os dias também o síndico passa na rua por que é responsável; pára diante de cada casa; manda colocar todos os moradores às janelas (os que habitassem nos fundos teriam designada uma janela dando para a rua onde ninguém mais poderia se mostrar); chama cada um por seu nome; informa-se do estado de todos, um por um - "no que os habitantes serão obrigados a dizer a verdade, sob pena de morte"; se alguém não se apresentar à janela, o síndico deve perguntar a razão: "Ele assim descobrirá facilmente se escondem mortos ou doentes". Cada um trancado em sua gaiola, cada um à sua janela, respondendo a seu nome e se mostrando quando é perguntado, é a grande revista dos mortos e dos vivos. Essa vigilância se apóia num sistema de registro permanente: relatórios dos síndicos aos intendentes, dos intendentes aos almotacés ou ao prefeito. No começo da "apuração" se estabelece o papel de todos os habitantes presentes na cidade um por um; nela se anotam "o nome, a idade, o sexo, sem exceção de condição"; um exemplar para o intendente do quarteirão, um segundo no escritório da prefeitura, um outro para o síndico poder fazer a chamada diária. Tudo o que é observado durante as visitas, mortes, doenças, reclamações, irregularidades, é anotado e transmitido aos intendentes e magistrados. Estes têm o controle dos cuidados médicos; e um médico responsável; nenhum outro médico pode cuidar, nenhum boticário preparar os remédios, nenhum confessor visitar um doente, sem ter recebido dele um bilhete escrito "para impedir que se escondam e se tratem, à revelia dos magistrados, doentes do contágio". O registro do patológico deve ser constante e centralizado. A relação de cada um com sua doença e sua morte passa pelas instâncias do poder, pelo registro que delas é feito, pelas decisões que elas tomam.

Cinco ou seis dias depois do começo da quarentena procede-se à purificação das casas, uma por uma. Manda-se sair todos os moradores; em cada cômodo levantam-se ou penduram-se "os móveis e as mercadorias"; espalha-se perfume; ele é queimado depois de bem fechadas as janelas, as portas e até os buracos de fechadura que se enche de cera. Finalmente fecha-se a casa inteira enquanto se consome o perfume; como na entrada, revistam-se os perfumadores "na presença dos moradores da casa, para ver se eles não têm à saída qualquer coisa que não tivessem ao entrar". Quatro horas depois, os moradores podem entrar em casa.

Esse espaço fechado, recortado, vigiado em todos os seus pontos, onde os indivíduos estão inseridos num lugar fixo, onde os menores movimentos são controlados, onde todos os acontecimentos são registrados, onde um trabalho ininterrupto de escrita liga o centro e a periferia, onde o poder é exercido sem divisão, segundo uma figura hierárquica contínua, onde cada indivíduo é constantemente localizado, examinado e distribuído entre os vivos, os doentes e os mortos - isso tudo constitui um modelo compacto do dispositivo disciplinar. A ordem responde à peste; ela tem como função desfazer todas as confusões: a da doença que se transmite quando os corpos se misturam; a do mal que se multiplica quando o medo e a morte desfazem as proibições. Ela prescreve a cada um seu lugar, a cada um seu corpo, a cada um sua doença e sua morte, a cada cura seu bem, por meio de um poder onipresente e onisciente que se subdivide ele mesmo de maneira regular e ininterrupta até a determinação final do indivíduo, do que o caracteriza, do que lhe pertence, o do que lhe acontece.

Contra a peste que é mistura, a disciplina faz valer seu poder que é de análise. Houve em torno da peste uma ficção literária da festa: as leis suspensas, os interditos levantados, o frenesi do tempo que passa, os corpos se misturando sem respeito, os indivíduos que se desmascaram, que abandonam sua identidade estatutária e a figura sob a qual eram reconhecidos, deixando aparecer uma verdade totalmente diversa. Mas houve também um sonho político da peste, que era exatamente o contrário: não a festa coletiva, mas as divisões estritas; não as leis transgredidas, mas a penetração do regulamento até nos mais finos detalhes da existência e por meio de uma hierarquia completa que realiza o funcionamento capilar do poder; não as máscaras que se colocam e se retiram, mas a determinação a cada um de seu "verdadeiro" nome, de seu "verdadeiro" lugar, de seu "verdadeiro" corpo e da "verdadeira" doença. A peste como forma real e, ao mesmo tempo, imaginária da desordem tem a disciplina como correlato médico e político. Atrás dos dispositivos disciplinares se lê o terror dos "contágios", da peste, das revoltas, dos crimes, da vagabundagem, das deserções, das pessoas que aparecem e desaparecem, vivem e morrem na desordem.

Se é verdade que a lepra suscitou modelos de exclusão que deram até um certo ponto o modelo e como que a forma geral do grande Fechamento, já a peste suscitou esquemas disciplinares. Mais que a divisão maciça e binária entre uns e outros ela recorre a separações múltiplas, a distribuições individualizantes, a uma organização aprofundada das vigilâncias e dos controles, a uma intensificação e ramificação do poder. O leproso é visto dentro de uma prática da rejeição, do exílio-cerca; deixa-se que se perca lá dentro como numa massa que não tem muita importância diferenciar; os pestilentos são considerados num policiamento tático meticuloso onde as diferenciações individuais são os efeitos limitantes de um poder que se multiplica, se articula e se subdivide. O grande fechamento por um lado; o bom treinamento por outro. A lepra e sua divisão; a peste e seus recortes. Uma é marcada; a outra, analisada e repartida. O exílio do leproso e a prisão da peste não trazem consigo o mesmo sonho político. Um é o de uma comunidade pura, o outro, o de uma sociedade disciplinar. Duas maneiras de exercer poder sobre os homens, de controlar suas relações, de desmanchar suas perigosas misturas. A cidade pestilenta, atravessada inteira pela hierarquia, pela vigilância, pelo olhar, pela documentação, a cidade imobilizada no funcionamento de um poder extensivo que age de maneira diversa sobre todos os corpos individuais - é a utopia da cidade perfeitamente governada. A peste (pelo menos aquela que permanece no estado de previsão) é a prova durante a qual se pode definir idealmente o exercício do poder disciplinar. Para fazer funcionar segundo a pura teoria os direitos e as leis, os juristas se punham imaginariamente no estado de natureza; para ver funcionar suas disciplinas perfeitas, os governantes sonhavam com o estado de peste. No fundo dos esquemas disciplinares, a imagem da peste vale por todas as confusões e desordens; assim como a imagem da lepra, do contato a ser cortado, está no fundo do esquema de exclusão.

Esquemas diferentes, portanto, mas não incompatíveis. Lentamente, vemo-los se aproximarem; e é próprio do século XIX ter aplicado ao espaço de exclusão de que o leproso era o habitante simbólico (e os mendigos, os vagabundos, os loucos, os violentos formavam a população real) a técnica de poder própria do "quadriculamento" disciplinar. Tratar os "leprosos" como "pestilentos", projetar recortes finos da disciplina sobre o espaço confuso do internamento, trabalhá-lo com os métodos de repartição analítica do poder, individualizar os excluídos, mas utilizar processos de individualização para marcar exclusões - isso é o que foi regularmente realizado pelo poder disciplinar desde o começo do século XIX: o asilo psiquiátrico, a penitenciária, a casa de correção, o estabelecimento de educação vigiada, e por um lado os hospitais, de um modo geral todas as instâncias de controle individual funcional num duplo modo: o da divisão binária e da marcação (louco-não louco; perigoso-inofensivo; normal-anormal); e o da determinação coercitiva, da repartição diferencial (quem é ele; onde deve estar; como caracterizá-lo, como reconhecê-lo; como exercer sobre ele, de maneira individual, uma vigilância constante, etc.). De um lado, "pestilentam-se" os leprosos; impõem-se aos excluídos a tática das disciplinas individualizantes; e de outro lado a universalidade dos controles disciplinares permite marcar quem é "leproso" e fazer funcionar contra ele os mecanismos dualistas da exclusão. A divisão constante do normal e do anormal, a que todo indivíduo é submetido, leva até nós, e aplicando-os a objetos totalmente diversos, a marcação binária e o exílio dos leprosos; a existência de todo um conjunto de técnicas e de instituições que assumem como tarefa medir, controlar e corrigir os anormais, faz funcionar os dispositivos disciplinares que o medo da peste chamava. Todos os mecanismos de poder que, ainda em nossos dias, são dispostos em torno do anormal, para marcá-lo como para modificá-lo, compõem essas duas formas de que longinquamente derivam.

O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O princípio é conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. Pelo efeito da contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas celas da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que cada ator está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. O dispositivo panóptico organiza unidades espaciais que permitem ver sem parar e reconhecer imediatamente. Em suma, o princípio da masmorra é invertido; ou antes, de suas três funções - trancar, privar de luz e esconder - só se conserva a primeira e suprimem-se as outras duas. A plena luz e o olhar de um vigia captam melhor que a sombra, que finalmente protegia. A visibilidade é uma armadilha.

O que permite em primeiro lugar - como efeito negativo - evitar aquelas massas compactas, fervilhantes, pululantes, que eram encontradas nos locais de encarceramento, os pintados por Goya ou descritos por Howard. Cada um, em seu lugar, está bem trancado em sua cela de onde é visto de frente pelo vigia; mas os muros laterais impedem que entre em contato com seus companheiros. É visto, mas não vê; objeto de uma informação, nunca sujeito numa comunicação. A disposição de seu quarto, em frente da torre central, lhe impõe uma visibilidade axial; mas as divisões do anel, essas celas bem separadas, implicam uma invisibilidade lateral. E esta é a garantia da ordem. Se os detentos são condenados não há perigo de complô, de tentativa de evasão coletiva, projeto de novos crimes para o futuro, más influências recíprocas; se são doentes, não há perigo de contágio; loucos, não há risco de violências recíprocas; crianças, não há "cola", nem barulho, nem conversa, nem dissipação. Se são operários, não há roubos, nem conluios, nada dessas distrações que atrasam o trabalho, tornam-no menos perfeito ou provocam acidentes. A multidão, massa compacta, local de múltiplas trocas, individualidades que se fundem, efeito coletivo, é abolida em proveito de uma coleção de individualidades separadas. Do ponto de vista do guardião, é substituída por uma multiplicidade enumerável e controlável; do ponto de vista dos detentos, por uma solidão seqüestrada e olhada.(2)

Daí o efeito mais importante do Panóptico: induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder. Fazer com que a vigilância seja permanente em seus efeitos, mesmo se é descontínua em sua ação; que a perfeição do poder tenda a tornar inútil a atualidade de seu exercício; que esse aparelho arquitetural seja uma máquina de criar e sustentar uma relação de poder independente daquele que o exerce; enfim, que os detentos se encontrem presos numa situação de poder de que eles mesmos são os portadores. Para isso, é ao mesmo tempo excessivo e muito pouco que o prisioneiro seja observado sem cessar por um vigia: muito pouco, pois o essencial é que ele se saiba vigiado; excessivo, porque ele não tem necessidade de sê-lo efetivamente. Por isso Bentham colocou o princípio de que o poder devia ser visível e inverificável. Visível: sem cessar o detento terá diante dos olhos a alta silhueta da torre central de onde é espionado. Inverificável: o detento nunca deve saber se está sendo observado; mas deve ter certeza de que sempre pode sê-lo. Para tornar indecidível a presença ou a ausência do vigia, para que os prisioneiros, de suas celas, não pudessem nem perceber uma sombra ou enxergar uma contraluz, previu Bentham, não só persianas nas janelas da sala central de vigia, mas, por dentro, separações que a cortam em ângulo reto e, para passar de um quarto a outro, não portas, mas biombos: pois a menor batida, uma luz entrevista, uma claridade numa abertura trairiam a presença do guardião.(3) O Panóptico é uma máquina de dissociar o par ver-ser visto: no anel periférico, se é totalmente visto, sem nunca ver; na torre central, vê-se tudo, sem nunca ser visto.(4)

Dispositivo importante, pois automatiza e desindividualiza o poder. Este tem seu princípio não tanto numa pessoa quanto numa certa distribuição concertada dos corpos, das superfícies, das luzes, dos olhares; numa aparelhagem cujos mecanismos internos produzem a relação na qual se encontram presos os indivíduos. As cerimônias, os rituais, as marcas pelas quais se manifesta no soberano o mais-poder são inúteis. Há uma maquinaria que assegura a dissimetria, o desequilíbrio, a diferença. Pouco importa, conseqüentemente, quem exerce o poder. Um indivíduo qualquer, quase tomado ao acaso, pode fazer funcionar a máquina: na falta do diretor, sua família, os que o cercam, seus amigos, suas visitas, até seus criados.(5) Do mesmo modo que é indiferente o motivo que o anima: a curiosidade de um indiscreto, a malícia de uma criança, o apetite de saber de um filósofo que quer percorrer esse museu da natureza humana, ou a maldade daqueles que têm prazer em espionar e em punir. Quanto mais numerosos esses observadores anônimos e passageiros, tanto mais aumentam para o prisioneiro o risco de ser surpreendido e a consciência inquieta de ser observado.

O Panóptico é uma máquina maravilhosa que, a partir dos desejos mais diversos, fabrica efeitos homogêneos de poder. Uma sujeição real nasce mecanicamente de uma relação fictícia. De modo que não é necessário recorrer à força para obrigar o condenado ao bom comportamento, o louco à calma, o operário ao trabalho, o escolar à aplicação, o doente à observância das receitas. Bentham se maravilha de que as instituições panópticas pudessem ser tão leves: fim das grades, fim das correntes, fim das fechaduras pesadas: basta que as separações sejam nítidas e as aberturas bem distribuídas. O peso das velhas "casas de segurança", com sua arquitetura de fortaleza, é substituído pela geometria simples e econômica de uma "casa de certeza". A eficácia do poder, sua força limitadora, passaram, de algum modo, para o outro lado - para o lado de sua superfície de aplicação. Quem está submetido a um campo de visibilidade, e sabe disso, retoma por sua conta as limitações do poder; fá-las funcionar espontaneamente sobre si mesmo; inscreve em si a relação de poder na qual ele desempenha simultaneamente os dois papéis; torna-se o princípio de sua própria sujeição. Em conseqüência disso mesmo, o poder externo, por seu lado, pode-se aliviar de seus fardos físicos; tende ao incorpóreo; e quanto mais se aproxima desse limite, mais esses efeitos são constantes, profundos, adquiridos em caráter definitivo e continuamente recomeçados: vitória perpétua que evita qualquer defrontamento físico e está sempre decidida por antecipação.

Bentham não diz se se inspirou, em seu projeto, no zoológico que Lê Vaux construíra em Versalhes: primeiro zoológico cujos elementos não estão, como tradicionalmente, espalhados em um parque(6): no centro, um pavilhão octogonal que, no primeiro andar, só comportava uma peça, o salão do rei; todos os lados se abriam com largas janelas, sobre sete jaulas (o oitavo lado estava reservado para a entrada), onde estavam encerradas diversas espécies de animais.

Na época de Bentham, esse zoológico desaparecera. Mas encontramos no programa do Panóptico a preocupação análoga da observação individualizante, da caracterização e da classificação, da organização analítica da espécie. O Panóptico é um zoológico real; o animal é substituído pelo homem, a distribuição individual pelo grupamento específico e o rei pela maquinaria de um poder furtivo. Fora essa diferença, o Panóptico, também, faz um trabalho de naturalista. Permite estabelecer as diferenças: nos doentes, observar os sintomas de cada um, sem que a proximidade dos leitos, a circulação dos miasmas, os efeitos do contágio misturem os quadros clínicos; nas crianças, anotar os desempenhos (sem que haja limitação ou cópia), perceber as aptidões, apreciar os caracteres, estabelecer classificações rigorosas e, em relação a uma evolução normal, distinguir o que é "preguiça e teimosia" do que é "imbecilidade incurável"; nos operários, anotar as aptidões de cada um, comparar o tempo que levam para fazer um serviço, e, se são pagos por dia, calcular seu salário em vista disso.(7)

Este é um dos aspectos. Por outro lado, o Panóptico pode ser utilizado como máquina de fazer experiências, modificar o comportamento, treinar ou retreinar os indivíduos. Experimentar remédios e verificar seus efeitos. Tentar diversas punições sobre os prisioneiros, segundo seus crimes e temperamento, e procurar as mais eficazes. Ensinar simultaneamente diversas técnicas aos operários, estabelecer qual é a melhor. Tentar experiências pedagógicas – e particularmente abordar o famoso problema da educação reclusa, usando crianças encontradas; ver-se-ia o que acontece quando aos dezesseis ou dezoito anos rapazes e moças se encontram; poder-se-ia verificar se, como pensa Helvetius, qualquer pessoa pode aprender qualquer coisa; poder-se-ia acompanhar "a genealogia de qualquer idéia observável"; criar diversas crianças em diversos sistemas de pensamento, fazer alguns acreditarem que dois e dois não são quatro e que a lua é um queijo, depois juntá-los todos quando tivessem vinte ou vinte e cinco anos; haveria então discussões que valeriam bem os sermões ou as conferências para as quais se gasta tanto dinheiro; haveria pelo menos ocasião de fazer descobertas no campo da metafísica. O Panóptico é um local privilegiado para tornar possível a experiência com homens, e para analisar com toda certeza as transformações que se pode obter neles. O Panóptico pode até constituir-se em aparelho de controle sobre seus próprios mecanismos. Em sua torre de controle, o diretor pode espionar todos os empregados que tem a seu serviço: enfermeiros, médicos, contramestres, professores, guardas; poderá julgá-los continuamente, modificar seu comportamento, impor-lhes métodos que considerar melhores; e ele mesmo, por sua vez, poderá ser facilmente observado. Um inspetor que surja sem avisar no centro do Panóptico julgará com uma única olhadela, e sem que se possa esconder nada dele, como funciona todo o estabelecimento. E aliás, fechado como está no meio desse dispositivo arquitetural, o diretor não está comprometido com ele? O médico incompetente que tiver deixado o contágio se espalhar, o diretor de prisão ou de oficina que tiver sido inábil serão as primeiras vítimas da epidemia ou da revolta.

Meu destino, diz o mestre do Panóptico, está ligado ao deles (ao dos detentos) por todos os laços que pude inventar.(8) O Panóptico funciona como uma espécie de laboratório de poder. Graças a seus mecanismos de observação, ganha em eficácia e em capacidade de penetração no comportamento dos homens; um aumento de saber vem se implantar em todas as frentes do poder, descobrindo objetos que devem ser conhecidos em todas as superfícies onde este se exerça.

Cidade pestilenta, estabelecimento panóptico, as diferenças são importantes. Elas marcam, com um século e meio de distância, as transformações do programa disciplinar. Num caso, um situação de exceção: contra um mal extraordinário, o poder se levanta; torna-se em toda parte presente e visível; inventa novas engrenagens; compartimenta, imobiliza, quadrícula; constrói por algum tempo o que é ao mesmo tempo a contracidade e a sociedade perfeita; impõe um funcionamento ideal, mas que no fim das contas se reduz, como o mal que combate, ao dualismo simples vida-morte: o que se mexe traz a morte, e mata-se o que se mexe. O Panóptico ao contrário deve ser compreendido como um modelo generalizável de funcionamento; uma maneira de definir as relações do poder com a vida cotidiana dos homens. Bentham sem dúvida o apresenta como uma instituição particular, bem fechada em si mesma. Muitas vezes se fez dele uma utopia do encarceramento perfeito. Diante das prisões arruinadas, fervilhantes, e povoadas de suplícios gravadas por Piranese, o Panóptico aparece como jaula cruel e sábia. O fato de ele ter, até nosso tempo, dado lugar a tantas variações projetadas ou realizadas, mostra qual foi durante quase dois séculos sua intensidade imaginária. Mas o Panóptico não deve ser compreendido como um edifício onírico: é o diagrama de um mecanismo de poder levado à sua forma ideal; seu funcionamento, abstraindo-se de qualquer obstáculo, resistência ou desgaste, pode ser bem representado como um puro sistema arquitetural e óptico: é na realidade uma figura de tecnologia política que se pode e se deve destacar de qualquer uso específico.

É polivalente em suas aplicações: serve para emendar os prisioneiros, mas também para cuidar dos doentes, instruir os escolares, guardar os loucos, fiscalizar os operários, fazer trabalhar os mendigos e ociosos. É um tipo de implantação dos corpos no espaço, de distribuição dos indivíduos em relação mútua, de organização hierárquica, de disposição dos centros e dos canais de poder, de definição de seus instrumentos e de modos de intervenção, que se podem utilizar nos hospitais, nas oficinas, nas escolas, nas prisões. Cada vez que se tratar de uma multiplicidade de indivíduos a que se deve impor uma tarefa ou um comportamento, o esquema panóptico poderá ser utilizado.

Ele é [ressalvadas as modificações necessárias] aplicável a todos os estabelecimentos onde, nos limites de um espaço que não é muito extenso, é preciso manter sob vigilância um certo número de pessoas.(9) Em cada uma de suas aplicações, permite aperfeiçoar o exercício do poder. E isto de várias maneiras: porque pode reduzir o número dos que o exercem, ao mesmo tempo em que multiplica o número daqueles sobre os quais é exercido.

Porque permite intervir a cada momento e a pressão constante age antes mesmo que as faltas, os erros, os crimes sejam cometidos. Porque, nessas condições, sua força é nunca intervir, é se exercer espontaneamente e sem ruído, é constituir um mecanismo de efeitos em cadeia. Porque sem outro instrumento físico que uma arquitetura e uma geometria, ele age diretamente sobre os indivíduos; "dá ao espírito poder sobre o espírito". O esquema panóptico é um intensificador para qualquer aparelho de poder: assegura sua economia (em material, em pessoal, em tempo); assegura sua eficácia por seu caráter preventivo, seu funcionamento contínuo e seus mecanismos automáticos. É uma maneira de obter poder numa quantidade até então sem igual, um grande e novo instrumento de governo...; sua excelência consiste na grande força que é capaz de dar a qualquer instituição a que seja aplicado.(10)

Uma espécie de "ovo de Colombo" na ordem da política. Ele é capaz com efeito de vir se integrar a uma função qualquer (de educação, de terapêutica, de produção, de castigo); de aumentar essa função, ligando-se intimamente a ela; de constituir um mecanismo misto no qual as relações de poder (e de saber) podem-se ajustar exatamente, e até nos detalhes, aos processos que é preciso controlar; de estabelecer uma proporção direta entre o "mais-poder" e a "maisprodução".

Em suma, faz com que o exercício do poder não se acrescente de fora, como uma limitação rígida ou como um peso, sobre as funções que investe, mas que esteja nelas presente bastante sutilmente para aumentar-lhes a eficácia aumentando ele mesmo seus próprios pontos de apoio. O dispositivo panóptico não é simplesmente uma charneira, um local de troca entre um mecanismo de poder e uma função; é uma maneira de fazer funcionar relações de poder numa função, e uma função para essas relações de poder. O panoptismo é capaz de reformar a moral, preservar a saúde, revigorar a indústria, difundir a instrução, aliviar os encargos públicos, estabelecer a economia como que sobre um rochedo, desfazer, em vez de cortar, o nó górdio das leis sobre os pobres, tudo isso com uma simples ideia arquitetural.(11)

Além disso, o arranjo dessa máquina é tal que seu fechamento não exclui uma presença permanente do exterior: vimos que qualquer pessoa pode vir exercer na torre central as funções de vigilância, e que fazendo isso pode adivinhar a maneira como é exercida a vigilância. Na realidade, qualquer instituição panóptica, mesmo que seja tão cuidadosamente fechada quanto uma penitenciária, poderá sem dificuldade ser submetida a essas inspeções ao mesmo tempo aleatórias e incessantes: e isso não só por parte dos controladores designados, mas por parte do público; qualquer membro da sociedade terá direito de vir constatar com seus olhos como funcionam as escolas, os hospitais, as fábricas, as prisões.

Não há, conseqüentemente, risco de que o crescimento de poder devido à máquina panóptica possa degenerar em tirania; o dispositivo disciplinar será democraticamente controlado, pois será sem cessar acessível "ao grande comité do tribunal do mundo"(12) Esse panóptico, sutilmente arranjado para que um vigia possa observar, com uma olhadela, tantos indivíduos diferentes, permite também a qualquer pessoa vigiar o menor vigia. A máquina de ver é uma espécie de câmara escura em que se espionam os indivíduos; ela torna-se um edifício transparente onde o exercício do poder é controlável pela sociedade inteira.

O esquema panóptico, sem se desfazer nem perder nenhuma de suas propriedades, é destinado a se difundir no corpo social; tem por vocação tornar-se aí uma função generalizada. A cidade pestilenta dava um modelo disciplinar excepcional: perfeito mas absolutamente violento; à doença que trazia a morte, o poder opunha sua perpétua ameaça de morte; a vida nela se reduzia a sua expressão mais simples; era contra o poder da morte o exercício minucioso do direito de gládio. O Panóptico, ao contrário, tem um papel de amplificação; se organiza o poder, não é pelo próprio poder, nem pela salvação imediata de uma sociedade ameaçada: o que importa é tornar mais fortes as forças sociais - aumentar a produção, desenvolver a economia, espalhar a instrução, elevar o nível da moral pública; fazer crescer e multiplicar.

NOTAS:

1. L. de Montgommery, La Milice française, edição de 1636, p. 6-7.

2. Ordenação de 20 de março de 1764.

3. Ibid.

4. Marechal de Saxe, Mês rêveries, t. I, avant-propos, p. 5.

5. J.-B. de La Salle, Traité sur lês obligations dês frères dês Écoles chrétiennes, edição de 1783, p. 238-239.

6. E. Geoffroy de Saint-Hilaire empresta essa declaração a Bonaparte, sobre a Introdução às Notions synthétiques et historiques de philosophie naturelle.

7. J.B. de Treilhard, Motifs du code d'instruction criminelle, 1808, p. 14.

8. Escolherei os exemplos nas instituições militares, médicas, escolares e industriais. Outros exemplos poderiam ser tomados na colonização, na escravidão, nos cuidados na primeira infância.

9. Cf. Ph. Aries, UEnfant et Ia famille, 1960, p. 308-313, e G. Snyders, La Pédagogie en France aux XVIIe etXVIIIe siècles, 1965, p. 35-41.

10. L'ordonnance militairc. t. IXL, 25 de setembro de 1719. Cl. Ilustr. 5.

11. Daisy, Lê Royaume de France, 1745, p. 201 -209; memória anónima de 1775 (depósito da guerra, 3689 f. 156). ANavereau,Lelogementetlesutensilesdesgensdeguerredel439àl789, 1924,p. 132-135. Cf. ilustrs. n° 5-6.

12. Projet de règlement pour Paciérie d'Amboise, Arquivos nacionais, f. 12, 1301.


* Texto retirado do InformaZine Trimestral "Conheça seu inimigo" 'Sejamos realistas, pedímos o impossível?' de Fortaleza - CE, maio de 2002. Escrito por Adebiase, Anônimo, Cecília e Joaquim [Caixa Postal 3472 / CEP 60310-970 / Fortaleza - CE].

** Trecho retirado do livro "Vigiar e Punir" de Michel Foucault. Capítulo III, Panoptismo, páginas 161 à 172. Petrópolis, Editora Vozes, 1987.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Nuestra pátria... - LUCHA AUTONOMA

LUCHA AUTONOMA é uma banda punk do México, creio que do DF, ativa desde 1995. Alguns de seus membros fazem parte da J.A.R. (Juventude Anti-autoritária Revolucionária), coletivo libertário de viés punk criado no final do ano de 1993.

NUESTRA PÁTRIA...


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(Do CDR "Nuestra lucha no claudicara jamás")

Ouvi, mortais, o grito sagrado
De autonomia, justiça e dignidade
Nas vozes daquel@s quem lutam
em defesa da liberdade.
Libertári@s de todos os tempos
"não mais jugo!", podemos dizer
Durruti, Sandino, Zapata
O seu exemplo nos obriga a seguir
D@s trabalhador@s que não se renderam
seus carrascos ousam não invejar
A grandeza de habita seus peitos,
suas palavras fizeram tremer.
O lamento da criança que grita:
"Dá-me pão, dá o pão, dá-me pão,"
lhe responde a terra tremendo,
e o povo se levanta armado
Desde um pólo até outro ressoa
este grito que o burguês aterroriza,
e @s punks repetem em coro:
"A nossa pátria, burguês, é a terra!" (5x)


Letra adaptada de um cancionero anarquista chamado "Viva la anarquia!". Ouça aqui a original.


O que é a J.A.R.?


Para começar, pensamos que...
Desde crianças, nos disseram que a bondade
e a sabedoria reinam na sociedade,
mas vamos crescendo e nos damos conta
que apenas @s cínic@s, @s rasteir@s e @s
déspotas são @s que obtém um posto
entra a abundância e o poder, enquanto
90% das pessoas não possuem mais que
sua força de trabalho que será absorvida
junto com sua saúde e sua juventude
em décadas de trabalho alienante.

Nos acusam de louc@s, de inadaptad@s, de vândalos
de utópicos e que para vocês
o delito é lutar por uma vida digna para
todas as pessoas para todas terem
o direito de serem donas de suas vidas, lutar por justiça
liberdade, igualdade.
Por acaso isso é loucura?

Miséria, injustiça, frustração, desastre
ecológico, tudo isso já é algo comum e
acima de tudo querem que nos
acostumemos a viver assim, na
humilhação, não podemos ficar
de braços cruzados
Temos que fazer algo!

Para saber mais, assista os vídeos abaixo sobre a J.A.R.







Adeus a Antônio Martinez (*)

Na madrugada do dia 29/10/98 falecia o militante anarquista Antônio Martinez. Contava com 83 anos quando teve de ser internado no hospital de Jabaquara em São Paulo; foi submetido à uma cirurgia que arrancou-lhe um tumor maligno da cabeça. Teve alta e, quando convalescia em casa, foi internado novamente no hospital do Parque Mundo Novo, onde veio a falecer de pneumonia dupla. "Martins", como era carinhosamente chamado pel@s seus/suas companheir@s, deixou-nos às 3:30 h da manhã. Seu velório foi no cemitério do Araçã, onde foi enterrado às 16:00 h do mesmo dia. Seu caixão simples não continha flores, apenas uma velha bandeira negra improvisada de última hora e o cristo no crucifixo de seu velório fora virado para a janela, simbolizando o último gesto de sua dignidade - se deus não o acompanhou em vida, também não o acompanharia na morte. Martins nada deixou escrito, recusava-se relutantemente a qualquer atividade teórica; também recusava qualquer tentativa de registro pessoal: fotos, depoimentos, entrevistas, nada...queria permanecer anônimo. Nós mesm@s o vínhamos assediando para o registro de suas memórias e, quando parecia tê-lo convencido, a morte nos impediu. Apesar disto, tod@s que passavam pelo CCS conheciam o Martins. O exemplo sempre foi sua maior propaganda e da qual ele sabia faze-lo como ninguém. Nas atividades do CCS era sempre o primeiro a chegar, jamais se atrasava...sentava-se sempre no fundo da sala e, quando algum/a inadvertid@ conferencista tocava nalgum tema de seu interesse, lá estava ele, com dedo em riste, falando alto e firme: "Eu discuto com qualquer um: advogado, economista...qualquer um"; e de fato discutia. Martins foi aquele tipo de militante simples e anônimo de que fala Penef (1), "Atores secundários, circunstanciais, nem lideranças ou celebridades, nem pessoas obscuras perdidas na multidão; mas pessoas que têm ação organizada, sem vantagem material ou poder, sem ser membr@ de uma burocracia" e que dedicou toda a existência a uma causa. "É uma enorme felicidade saber que o Anarquismo tem produzido figuras tão íntegras e bonitas como ele. É uma das muitas verdades que temos e devemos passar para frente", dizia Margareth Rago (2) quando perdemos o companheiro Jaime em maio deste mesmo ano. Martins era um "tipo humano" de uma época e de um meio muito particular, possuía uma cultura enciclopédica e uma simplicidade de operário manual. A geração da qual pertenceu divertia-se lendo, entre outras coisas O Manolin e o II Certame Socialista; de uma geração de velh@s militantes do movimento anarquista na capital de São Paulo, homens que iniciaram sua militância já no início da década de 30, que dedicaram sua vida a uma concepção de mundo, onde o valor de um ideal que se pretende realizar toma o sentido de sua vidas, um ethos para o qual se tende a basear sua conduta no mundo. Se é verdade o que a sociologia diz que todo homem participa, de uma maneira ou de outra, da história de uma determinada sociedade através de sua biografia, isso é sobretudo verdade em homens como Martins. Depois de ter ganho sua confiança me contava suas "façanhas" que iam desde a batalha contra os integralistas na Praça da Sé, onde empunhou armas junto ao movimento operário em 1934, até sua convivência com @s morador@s de um cortiço no bairro do Brás, onde viveu a maior parte de sua infância e de sua adolescência. Personalidade reta, firme, como, como é possível tanta convicção reunida em um só homem? "Ah, se eu tivesse meus cinqüenta anos...", suspirava sentindo o peso dos seus oitenta anos de muita atividade libertária; "Se tenho esses cabelos brancos e estou neste movimento até hoje, é porque não encontrei nada melhor lá fora!", falava com certeza de que só um homem no final da vida teria. "Abaixo todos os dogmas religiosos e filosóficos, eles nada mais são do que mentiras, a verdade não é uma teoria, mas um fato!"3, são palavras que encontravam-se incrustadas em sua personalidade. Nele o ideal ganhava expressividade e vitalidade; por ele concretiza sua identidade e dava substância a sua existência eminentemente libertária; com ele vencia os limites, adquiria força, entusiasmo, esperança e permitia-se transpor a realidade, por mais invencível que se lhe apresentasse. As memórias deste velho companheiro se encontram de esparsas recordações entre jovens e velh@s que tiveram o privilégio de conhecê-lo. Nunca conheci uma pessoa onde simplicidade e idealismo fossem reunidos com tamanho vigor. No seu leito de morte, como se o prelúdio de sua partida houvesse lhe sido anunciado, me disse: "Tanta coisa grande para se fazer rapaz, e eu aqui desse jeito...!" Antônio morreu...a beleza de sua energia, de ouvir suas palavras e depois poder olhar para as coisas com um certo otimismo idealista, de ver que o sonho também tem mais de 80 anos e vive como se tivesse 17, tudo isto, tenho certeza, ele deixou para aquel@s que o cercavam. A nossa dor é por tê-lo deixado partir assim injustamente, sem história...os homens não merecem monumentos, mas livros, registros de suas frustrações e vitórias. É uma pena que as futuras gerações se furtem delas... Descansa meu velho...você merece, mas tenha a certeza que não morrestes totalmente!

Nildo Batata (Centro de Cultura Social/SP)

Referências:
1 PENEFF, M. Mythes n life stories. In: SAMUEL, R. & THOMPSON, P. The Mytes we live by. London, Pontledge, 1990.
2 RAGO, M. "Quem foi Jaime Cubero?", mural eletrônico de Jaime Cubero.
3 BAKUNIN, M. Bakunin por Bakunin...cartas. Brasília, Novos Tempos, 1987.

* Texto retirado do blog INOMINÁVEL.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Independence Day - DIR YASSIN


"Especialmente aqui em Israel embora haja tanta política no cotidiano, mesmo na cena punk há geralmente um desinteresse real por política ou por como as coisas vão à nossa volta, então nós tentamos forçar as pessoas a ter consciência do que está acontecendo. Você não pode escapar e não fará muito bem se você fingir que não existe. A maioria das bandas punks canta sobre coisas como ficar bêbado, o que é justo, você tem isso em qualquer país, mas eu acho que aqui a situação é tão politizada que é impressionante que punk aqui seja tão apolítico. Em teoria deveria ser um terreno fértil para bandas punks mas a maioria delas não quer lidar muito com eventos políticos que acontecem aqui. Nossas músicas são bastante conscientes politicamente, lidando com nosso posicionamento. Nós queremos forçar esses punks que não ligam para política a pelo menos lidar com a realidade".


Independence Day (Dia da Independência)


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(Do S/T EP)

A bandeira da nação decora nossas varandas.
Nos territórios ocupados eles ainda estão quebrando os ossos.
E no seu centro, uma suástica de estilo sionista,
simbolizando a opressão judaica.

Cores pastoris banca e azul
não podem ocultar as manchas de sangue
de opressão, exploração e
discriminação que vem acontecendo
por cem anos.

Cultura militarista, cultura religiosa,
Qualquer outra cultura é anti-sionista.
Passar o dia enfrentando cenas
de opressão é o preço por 2.000
anos da nossa visão nacional.

Um complexo holocausto que limpa
você de qualquer culpa
de um genocídio que está em suas mãos.
Uma complexa identidade que fez você
ser pego em uma guerra que não é sua.

Sangue palestino tem irrigado este país
E trabalhador@s estrangeir@s o construíram.
Nós tod@s somos peg@s em uma máquina
Cujo único propósito é a injustiça social.

Anti-sionismo em um estado militar.


Israel 17.11, 10,2 e além...

Agora eu me sinto mais desconectado do que nunca deste país. Para todo lugar que olho eu vejo dor e exploração. Até a casa onde vivi metade da minha vida parece não como um álbum de minhas memórias infantis mas apenas como um instrumento de colonização sionista. Os eventos que ocorreram nestas últimas semanas vieram como um tempestuoso vento oriental e expuseram a verdadeira face da esquerda israelense. Se eu tinha minhas dúvidas sobre a disposição do lado israelense a retirar-se dos territórios numa tentativa de alcançar um acordo político (não faz sentido sequer pensar sobre progredir em qualquer problema social no sentido mais reformista), isso apenas estourou em meu rosto e espirrou gotas de cuspe grandes como melancias.
Quando os eventos começaram eu estava fora de Israel, mas lá mesmo eu já senti o fedor da direita tradicional voltando e espalhando seu ódio no coração das pessoas. Como viciad@s em ódio tentando parar seu uso, a nova onda de repugnância deu a el@s uma dose direto numa veia principal, no pescoço, e estava bombeando em seus corpos vibrantes, inflando as veias da testa e atirando por toda parte sem distinção. O "Novo Oriente Médio" que @s compadecid@s esquerdistas prometeram entregar não parece mais agora com um novíssimo shopping suburbano mas mais com um ferro velho de uma área industrial.
Helicópteros que continuam cruzando os céus num vai e vem distraem meu olhar dos avisos divulgando "deixe as IDF (Forças Armadas Israelenses) vencerem". A "política de contenção" israelense precisa ser deposta pela impaciência revolucionária das pessoas. Desejo mortal: fim o mundo, e tudo de guerra e morte para tod@s escapa de suas gargantas e a bíblia, talvez escrita por seus ancestrais, prova novamente que tem vida própria. Em ambas as religiões há um "efeito guerra sagrada" (como solução política) e @s crentes empurram ansiosamente el@s para perto de Deus, agora em um sentido "espiritual" e no futuro próximo em um físico também.
O lado israelense perdeu umas duas dezenas de pessoas até agora e a direita já está gritando e exigindo do governo para "tirar suas luvas de veludo" e avançar com a artilharia pesada. "Dê carta branca as IDF", el@s estão divulgando, em posters coloridos, e "morte aos árabes" gritam no segundo que a câmera aponta para el@s - sim, a mesma câmera que el@s culpam por não permitir as IDF de "colocar um fim em tudo" com bombas e aviões laçados no centro das vilas e cidades palestinas. Centenas de vítimas palestinas, milhares de ferid@s mas isso não os impede de jogar pedras - el@s não tem chance de usar artilharia pesada.
No começo eu estava feliz que as revoltas começaram perto da minha casa (mesmo com o medo pelas vidas de meus parentes me consumindo por dentro), "Tragam a guerra para casa", eu disse a mim mesmo com um sorriso. Já era tempo das pessoas verem frustração explodindo perto de suas casas de uma "perspectiva civil" (não estando ativ@s nas forças armadas) e não apenas pela TV. Por exemplo, eu fui ingênuo o suficiente em pensar que as pessoas tentariam pensar e compreender porque @s árabes israelenses - a população árabe que vive dentro da fronteira anterior à guerra de 67, e que são considerad@s cidadãos israelenses que supostamente desfrutam disso, estão protestando e jogando pedras no meio das cidades israelenses. Eu achei que el@s iriam acordar, abrir seus olhos e ver o que acontece nos territórios ocupados dia à dia, como a contínua "judaicanização" que acontece em todas as partes pelo país: desde o confisco de terras na Galiléia até a construção de apartamentos luxuosos em Jaffa. Obviamente, seria pedir demais
e não é tão divertido quanto analisar a mente do Arafat, o passatempo d@s "especialistas do oriente médio" israelenses.
Com esta completa camuflagem midiática, qualquer coisa pode parecer mais razoável do que a verdade oficial: é a situação atual outra "conspiração"? Por exemplo: depois de ler a história deste país, não seria tão difícil para mim acreditar que o estado de Israel forneceu as armas palestinas porque seu uso seria uma justificativa perfeita para usar tanques para expulsar palestin@s e para criar questões territoriais a lá 1948. Talvez seja apenas uma óbvia resposta popular à recusa de Israel em aceitar tudo que tenha haver com os acordos de paz. Mas outra possibilidade é que Israel nunca esperou alcançar um acordo de paz e apenas queria se livrar das áreas pobres e problemáticas e seus habitantes com um gesto de aceitação da comunidade internacional. Paz sem justiça é um conceito vazio nesse contexto. E justiça requer deste país muito mais do que a mentalidade atual pode oferecer.
A idéia de usar Dir Yassin como nome da banda era para tentar criar algum tipo de desconforto que (nós esperávamos) poderia levar à um despertar e libertação numa pequena parte da juventude local: trocar valores judaicos / sionistas por uma vontade de explorar aqueles lados da história israelense que não foram ensinados em nossas escolas. Mas ainda assim nossas pretensões eram limitadas e ninguém na banda era ingênuo o suficiente para acreditar que nós alcançaríamos mais do que um punhado de pessoas. Se o comportamento ou reação dos "posers" durante os eventos dos últimos meses pudesse ser considerada como um teste da receptividade de nossas idéias entre el@s, então nós sabemos que fracassamos.
Mas apesar da nossa desilusão, desespero e sentimento de fracasso, e mesmo com a influência dominante da mídia israelense no ocidente (onde a maioria das cópias deste disco irão acabar), eu sei que existem ouvidos abertos para @s palestin@s e para nós pelo mundo. Nós continuaremos tentando, e mais importante, @s palestin@s continuarão lutando.
Agradecimentos e solidariedade,
DIR YASSIN


O PROJETO SIONISTA (*)

Em 1948 um acordo entre um grupo de judeus imperialistas (sionistas), a Grã-Bretanha e a América criaram o Estado de Israel. Não surpreendentemente, o Estado Sionista é bem semelhante às outras missões imperialistas da Grã-Bretanha e da America pelo mundo.
A criação de Israel expulsou mais de três milhões de palestin@s de sua terra natal. Aquel@s que permaneceram vivem sobre um brutal estado de apartheid, como não judeus dentro de um sistema criado inteiramente para judeus. Não é incomum escutar @s sionistas se referem às/aos palestin@s como "baratas" ou "cães imundos".
Assim, palestin@s são tratad@s como @s negr@s americanas após a guerra civil, empurrad@s, escarrad@s, colocad@s em guetos, impiedosamente explorad@s e freqüentemente brutalmente agredid@s. Enquanto isso, qualquer judeu em qualquer parte do mundo é vigorosamente encorajad@ a morar na palestina, empurrando as pessoas para fora ainda mais.
Compreensivelmente, quando Israel declarou-se uma nação, em 1948, todas as nações árabes ao redor declararam guerra contra el@s. @s árabes perderam a guerra ainda mais a Palestina que as Nações Unidas prometeram aos sionistas. Novamente, em 1967, as nações árabes lutaram uma guerra contra @s sionistas, e novamente perderam. Ao final da guerra, Israel tinha seu exército posicionados na Cisjordânia, na margem ocidental do Rio Jordão, na Faixa de Gaza e na Costa do Mar Mediterrâneo.
A ocupação militar continua, e aumenta sua viciosa
dominação d@s palestinian@s. Centenas de novos subúrbios só para judeus desenvolvidos estão constantemente sendo construídos e milhares de colonos judeus (que escolheram ser israelenses) chegam para roubar grandes partes da palestina. Os colonos vêem sua presença na Cisjordânia e na Faixa de Gaza como um projeto missionários para apoiar a "sagrada" terra de Israel. El@s geralmente estão armad@s, e freqüentemente mostram seu apoio estilo KKKlan em campanhas de terror contra @s palestin@s.
Os assentamentos são conectados por atalhos patrulhados militarmente e estradas só para judeus, assim os judeus podem contornar as pessoas cujos terrenos estão roubando. A terra palestina está rapidamente sendo confiscada através de leis imperialistas que toleram roubo. O exército israelense desmatou milhares de árvores de oliva para quebrar a economia palestina. Casas palestinas freqüentemente são demolidas como punição por resistir à ocupação.
Os territórios ocupados são crivados de pontos de revista militar onde milhares de palestin@s são diariamente submetid@s à revistas degradantes pelos militares israelenses. A população palestina é obrigada a pagar uma série de impostos para financiar sua própria subjugação.
Tudo isto se encaixa dentro do modelo britânico na Irlanda, dos países baixos na África do Sul, do modelo americano nas Turtle Island, do modelo espanhol em terras astecas, e assim por diante. E a América apóia explicita e rigorosamente as políticas de Israel: com armas, dinheiro, helicópteros, propaganda, tanques e manipulação política.


A INTIFADA (*)

A palavra árabe "Intifada" é aproximadamente traduzida como "levante" ou "agitação." É a palavra que @s palestin@s escolheram para nomear sua luta popular contra Israel.
A Intifada original foi uma campanha maciça de inconformismo com o Estado Sionista abrangendo desde 1987 até 1992. A Intifada teve o apoio de quase 100% da população palestina e inclui: boicote às mercadoria israelenses, manifestações massivas, greves fiscais, greves d@s trabalhador@s, jogar pedras (1), cooperativas agrícolas, médicas, educacionais, habitacionais e de consumo para quebrar a ocupação israelense e para criar uma nova e independente nação palestina.
Embora unida sob a liderança da central de inclinação marxista da Organização para Libertação da Palestina (PLO), a Intifada foi efetuada por um complexo sistema de dezenas de "comitês de revolta" locais que poderiam permanecer funcionando mesmo quando muit@s de seus/suas líderes fossem pres@s.
Alguns dos mais respeitados lutadores da liberdade foram os shebab (literalmente "os rapazes"): a juventude palestina mascarada (alguns jovens de 7 ou 8 anos) que produziram graffitis, jogaram pedras para defender as comunidades e mataram palestin@s que colaboravam com Israel.
As mulheres também desempenharam um papel crítico na Intifada, participando em todos os níveis de resistência, enquanto continuavam exercendo a plena carga de tarefas exigidas pelas condições sexistas de sua sociedade. Em alguma medida, a necessidade por união na luta contra Israel permitiu um bom acordo em desestabilizar padrões patriarcais e expectativas normatizadas das mulheres.
A Intifada foi realizada enquanto Israel impôs duros (e às vezes com 24 horas de "atire se avistá-l@") toque de recolher em dezenas de cidades e vilas palestinas, às vezes por semanas à fio. As Forçadas Armadas Israelenses (IDF) freqüentemente matou palestin@s que "suspeitaram" serem "terroristas" (principalmente o shebab). Os israelenses explodiram palestin@s usando pequenos explosivos disfarçados para parecerem barras de chocolate para as crianças explodiram com o impacto do "doce".
Mas o espírito da Intifada era tal que, quando as casas ram demolidas ou as culturas de oliveiras eram destruídas pelos israelenses, as aldeias se uniam para plantar e reconstruir. E, quando @s trabalhador@s eram pres@s em suas casas pelo toque de recolher obrigatório, os comitês de revolta garantiam aos/às trabalhador@s salários completos pelo seu tempo fora de trabalho. Manifestações surgiram como que do nada e desapareciam dentro de quinze minutos; o shebab desaparecia no meio do resto da população palestina.
A Intifada estava por toda parte e em lugar nenhum.


UM BREVE HISTÒRICO DA OCUPAÇÃO (**)

De acordo com a decisão da ONU sobre a distribuição da terras entre @s palestin@s e os judeus, os últimos eram apenas 600.000 - 37 % da população - mas ficaram com 55% da terra. Quase metade dos palestin@s deveria ter ficado sob controle israelense. Esta decisão da ONU fez a Síria, a Jordânia, o Líbano e o Iraque unirem-se ao povo palestino na luta contra o novo Estado de Israel.
No final da Guerra de 1948 - que envolveu horríveis massacres (2) e expulsões - 2,5 milhão de palestin@s se tornaram refugiados. 737.166 palestinian@s foram expuls@s das suas casas
e terras. 531 aldeias palestinas foram inteiramente destruídas.
Na Guerra de 1967 Israel ocupou os montes Golã, Sinai, a Cisjordânia e a Faixa de Gaza. Antes de 1967, apenas 400.000 palestin@s eram residentes de Israel. Na ocupação de 1967, 1,1 milhões de palestin@s se somaram (muit@s del@s já eram refugiad@s). Poucos dias após a guerra um pequeno grupo radical de esquerda israelense Matzpen ("Bússola") publicou este comunicado: "ocupação resulta em regime estrangeiro, que resulta em resistência, que resulta em terror e contra-terror. Manter-se em territórios ocupados nos tornará um povo de assassin@s e vítimas de assassin@s".
Existem 6 milhões de refigiad@s palestin@s pelo mundo hoje:
2.000.000 na Jordânia
500.000 no Líbano
500.000 na Síria
900.000 em Gaza
800.000 na Cisjordânia
1.300.000 em outros países
A Intifada (revolta) d@s palestin@s que começou em 1987 resultou no início do "processo de paz" em 1993. O governo de Rabin assinou o Acordo de Oslo com a PLO (Organização para Libertação da Palestina) e a maioria d@s israelenses sentiram que estávamos colocando um fim à ocupação e iniciando novas relações com @s palestin@s e com o mundo árabe. Mas a realidade nos territórios ocupados era diferente - áreas A, B e C separavam os palestin@s em Bantustans (3). As áreas A estavam sobre pleno controle palestino, as áreas B debaixo de um controle conjunto palestino e israelense, enquanto as areas C estavam sob completo controle Israelense.


O PROCESSO DE "PAZ" (*)


Em 1992, a PLO (Organização para Libertação da Palestina) assinou um "Tratado de Paz" conhecido como o Acordo de Oslo, Israel e os EUA cuidadosamente fabricaram os acordos para assegurar que @s palestin@s teriam uma ilusão de autonomia suficiente para garantir que parassem de lutar, mas nada substancial o bastante para ameaçar o imperialismo sionista-americano ou resultar em um ganho de qualquer liberdade verdadeira.
Semelhante ao acordo alcançado em 1947 de partilha da Índia (que resultou num massacre de mais de 2 milhões) e aos tratados que o exército norte-americano fez com as Lideranças Indígenas (4) por "enquanto a grama crescer e o sol brilhar..." (camuflagem do extermínio de mais de 95% da população nativa - mais de dez milhões de pessoas) o Acordo de Oslo era simplesmente outra arma do colonizador. Essencialmente, à Autoridade Palestina (PA) (5) foi dado o controle de policiar algumas pequenas porções da palestina ainda ocupada, desde que permanecessem leais aos objetivos sionistas. Os assentamentos continuariam, a construção de pontos de vigilância (revista) nas estradas continuaria, os Estados Unidos continuariam armando Israel, e um punhado da elite palestina poderia policiar sua própria população.


A INTIFADA DE AL-AQSA (*)


O fracasso grosseiro do "processo de paz" para trazer qualquer mudança cotidiana na vida d@s palestin@s, juntamente com a corrupção desenfreada da Autoridade Palestina e a ascensão ao poder do açougueiro assassino Ariel Sharon (6) em Israel, provocou a Segunda Intifada.
É conhecida como a Intifada de “Al-Aqsa”, por que em 28 de setembro de 2000, como uma provocação intencional, Sharon visitou a mesquita de Al-Aqsa em Jerusalém, desencadeando uma onda de revolta que foi o renascimento da Intifada Palestina. De volta dessa vez, o levante palestino é feroz e resistindo veementemente aos imperialistas bastardos. Atentados suicidas dentro das cidades Israelenses e assentamentos sionistas aumentaram em freqüência e força Muitas manifestações massivas incluíram pessoas armadas que atirariam em resposta ao exército israelense e um número de revoltas em larga escala eclodiram nos territórios ocupados. Essa nova Intifada é um tumulto furioso contra ambos as ocupações sionista e americana e a tradicional liderança palestina. A PLO e a PA terem aceitado descontroladamente riquezas e o papel de reprimir os levantes populares e convidando os EUA para derrubar revoltas palestinas estão agora sendo expostos pelo que se tornaram: inimigos da liberdade palestina.
Organizações islâmicas militantes, principalmente o Hamas, agora estão fazendo o papel de serviço social na comunidade palestina e na linha de frente dos ataques contra Israel. Israel responde a maneira dos verdadeiros colonizadores: nunca recuar para fortalecer sua sistemática dizimação do povo, das casas, e da dignidade d@s palestin@s (7).


NOTAS DE TRADUÇÃO:

1 - Essa Primeira Intifada (iniciada em 9 de dezembro de 1987) também é conhecida como "guerra das pedras".

2 - "O massacre de Deir Yassin se refere à matança de entre 107 e 120 civis palestinos desarmados (estimativa geralmente aceita pelos estudiosos, durante e possivelmente após a batalha), ocorrida na vila de Deir Yassin (também grafada Dayr Yasin ou Dir Yassin), nas proximidades de Jerusalém, no que então era o Mandato Britânico da palestina, cometida pelas forças de guerrilha judaico-sionistas (Irgun e Lehi) entre 9 de abril e 11 de abril de 1948." Fonte: Wikipedia. Para saber mais sobre este massacre, veja o documentário "Deir Yassin Remembered": parte 1 / parte 2 / parte 3 / parte 4

3 - Bantustans são territórios atribuídos aos bantos (modo como se referiam aos negr@s na África do Sul). São territórios designados pelo regime vigente para manter um estado de segregação, com restrita autonomia política e gestão colonialista. Foi um instrumento utilizado contra as populações negras na África do Sul, contra os palestin@s e contra os curdos.

4 - Para saber mais sobre isso, recomendo o livro "Enterrem meu coração no curva do rio", de 2003, da Editora L&PM.

5 - "A Autoridade Palestina surgiu como resultado dos Acordos de Oslo, assinados em Setembro de 1993 por Israel e a Organização para a Libertação da Palestina." Fonte: Wikipedia.


6 - Ariel Sharon liderou as Unidades 101 no Massacre de Qibya, no outono de 1953, quando cerca de 60 civis palestinos foram mortos num ataque na Cisjordânia. Observadores da ONU falaram que as pessoas foram impedidas de sair enquanto suas casas foram demolidas sobre elas.

7 - "Em fevereiro de 2005 o primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon e Mahmoud Abbas, encontraram-se numa cimeira em Sharm al-Sheikh e declararam uma trégua que terminou com a intifada de Al-Aqsa. Em Setembro do mesmo ano, Israel deu por terminada a retirada dos seus co
lonatos da Faixa de Gaza e a partir de então a AP passou a assumir o controlo daquele território". Fonte Wikipedia. Mas novas tensões surgiram, e estão agravadas na autalidade, com a ocupação da Faixa de Gaza. Este é um tema para um post futuros. Sobre a vida em Gaza, veja o poema e os vídeos abaixo.



O ESTRANGEIRO (***)

Hayil'Assaqilah


Não se apoderem de meus olhos
Sou o estrangeiro
em busca de uma pátria
meu coração se esmigalhou
sobre as montanhas da neve, do sangue e da geada
caminhei com as crianças
me abandonaram
na noite da fome, do sangue e da geada
levantaram sobre minhas costas
as tábuas de meu ataúde

Não me exterminem
sou o estrangeiro
em busca de uma pátria...

que erro cometeu meu povo
para que viva hoje
numa terra em ruínas
que erro cometeu o pássaro
para que o joguem de um bosque a outro
que erro cometeu meu coração
para que derramem sobre ele
a catástrofe e tanta dor.


* Trechos selecionados e traduzidos livremente do informativo "International Intifada: An urgent call to participate in the colonizer’s execution" publicado e distribuído pela Firestarter Press (po box 50217 / baltimore, md 21211 usa). Junho de 2002, re-editado em abril de 2003.
** Trecho selecionado e traduzido livremente do informativo "Alternativa libertária" editado pela FDCA - Federeção Anarco-Comunista da Itália (Alternativa Libertaria CP 27 61032 Fano (PU) Italy / email: fdca@fdca.it). Retirado de uma palestra dada pelo jornalista Uri Aylon em Manchester em junho de 2004.
*** Poema retirado do livro "Poesia Palestina de Combate", publicado em 1981, pela Editora Achiamé, Rio de Janeiro.






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